segunda-feira, dezembro 28, 2015

O medo da gente que a gente tem

A gente tem medo, todo mundo tem. Tem gente que tem medo da morte e pra compensar vive intensamente. Tem gente que não pensa sobre a morte mas treme nas bases quando o assunto é viver. Vive em parcelas, em prestações, com medo de magoar o outro e a si mesmo. Vive cheio de dedos, de melindres. Abraça mas não cheira. Cheira mas não beija. Beija mas não fode. Fode mas não sente. Tá sempre por ali dando um jeito de escapar pela tangente. 

Há, inclusive, a modalidade de não se deixar atingir diretamente por alguém, no máximo pela tristeza que possa causar ao próximo. Ou a alegria. O reflexo do próprio eu que volta trazendo uma nova informação que só existiu porque você existe e faz questão de afirmar isso em alto e bom som, pra não haver dúvidas. Sim, um tanto prepotente e arrogante esse pensamento, mas humano que somos não escapamos de cair na nossa própria ladainha. O perigo é acreditar de fato nisso, pois a que se pensar que esse tipo de medo, o último a qual me referi, tá mais com cara de quem joga para o outro uma fragilidade que é sua, usando esse artifício bobo, falho e raso de que a mágoa ou o prazer será causado, no fim das contas, apenas por nós mesmos. E o complemento tímido de que espera estar errado, porque fica um tanto esquisito não assumir de alguma forma que somos feitos de carne, osso e um bocado coração. Inatingível e inabalável, duas características que o homem não é por mais fantástica que a ideia pareça. Nem insubstituível. Então vamos com calma. 

Agora, conscientes disso, nos damos conta que estamos em um beco sem saída? Aceitamos a condição de viver o outro em sua superfície? Nos jogamos nessa piscina limitada, com pouca água? Vamos embora ao encontro de um mar aberto onde podemos percorrer sem medo de meter a testa nos arrecifes ou que tenha avisos luminosos de Perigo, praia sujeita a ataque de tubarão? Qual seria a solução?

É bem verdade que as pessoas-piscina, quadradas e limitadas coronariamente falando, são menos fascinantes que as pessoas-mar, vastas em sua plenitude, sem formato concreto, pessoas pouco geométricas. Eu sempre fui essa segunda opção e nunca foi importante quantas vezes minha testa tenha partido em mil pedaços. Se quebrava eu tratava de consertar e sair mais forte. Coração quebrado nunca foi uma desculpa ou um dispositivo de defesa pra me fechar no meu mundo que era mar ou rio, pra virar piscina. Nem doce e nem salgada: um negócio artificial e cheio de cloro. 

Parece que tudo ficou resolvido e claro. E que sabemos por onde percorrer. Acontece que, além disso tudo, tem uma confusão medonha no meio. É que tem gente piscina se fazendo de mar. E ai fica um negócio forçado, dá uma preguiça e também vontade de sair correndo pela terra o mais longe que se pode. E tem gente mar se prestando a papel de piscininha infantil que enche com a boca e mal cabe a própria pessoa dentro, tudo por um medo que não se concretiza e nem dissolve. Aquele tal do medo que na verdade é um medinho que faz sombra sempre que a pessoa tá sol demais. 

É essa gente que mais me preocupa: um universo inteiro comprimido em meio metro quadrado de possibilidades.

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