sexta-feira, junho 14, 2013

Através




à Maria

Ontem eu te vi me vendo por dentro e acompanhando com ar de surpresa cada palavra que eu falava. Palavras molhadas de cerveja. Ao menos já não são mais de lágrimas. E o que mais me impressionou foi a constatação de que você, minha amiga próxima há longos dez anos, desacreditava até ontem em minha capacidade de ser humana a ponto de sofrer. Era como se isso não fosse possível comigo, 'com calinha não', ou ao menos não desse jeito, com essa maturidade no ato de sentir, dor. Confusa (admitindo a confusão) e em carne viva. Viva! 

'Nunca te vi falando assim', foi o que você me disse com palavras e esses seus olhos enormes. E, ao mesmo tempo que te ví surpresa, te ví também contente. Parece que pela primeira vez nos encontramos nesse ponto máximo da vida e finalmente pra mim sofrer podia ser uma coisa natural. Como é pra você, como é para as pessoas que a gente conhece e também para as desconhecidas. 

Na verdade me espanta o teu espanto. Passei o dia pensando sobre isso. Eu tenho 25 anos e já passei por tanto nessa vida, tristezas profundas, traumas, perdas irremediáveis e você, que sabe minha história de cor e que dela poderia sair um filme cheio de lágrimas, duvidasse de minha capacidade de sentir vazios. Por que? Já me visse triste várias vezes. Já choramos juntas outras tantas. Mas parece que ontem foi mais real, né? Eu sai da condição de suporte, daquela que sempre tem os conselhos mais sábios, desapegados e leves para ser o outro lado, o lado por igual. Eu não sou de aço e apesar de levar a vida da maneira mais leve que se é possível, com esse otimismo que você admira tanto, eu ainda sou feita de carne, osso, coração e um bocado de músculos involuntários que eu sequer sei os nomes. Alguém que também sente necessidade de tanta coisa, inclusive desse vácuo. Por mais absurdo que pareça, também sei arredar, parar, acalmar e, quem diria, aceitar. Aceitar esse negócio estupendo, solúvel e volúvel que é a vida. Assim, da maneira como ela é e se mostra a cada nuance. 

Não reclamo mais, miro e sou alvo dela. A cada tiro, a cada queda. Levanto. E cá estou, contente da vida por ter te mostrado isso no alto dos nossos 10 anos de amizade. Quem sabe agora não podemos caminhar (ainda) mais próximas? Eu também sei sofrer, tas vendo? Você que nunca viu. Ou eu que nunca mostrei. Um a zero pra gente.

Um comentário:

Thaís Salomão disse...

obrigada pelo presente, me fez chorar horrores e borrar toda uma maquiagem,a transformando em algo, sem dúvidas, conceitual! hahahahha mas veja, logo nesse momento que eu que to desesperadamente tentando lutar contra tudo, me vi ali não do lado da pessoa que eu sempre quis ser agora, nesse momento da minha vida..e quando vi o teu sofrer tambem,eu só pensei: caramba, agora sim, mais ainda, eu gostaria de ser tu nesse momento.. de vivenciar como tu esse momento. um dia, eu chego lá. fiquei feliz demais por te ver quase chorar. significa que significou muito aquele momento de compartilhamento! te amo! longa vida ao nosso placar! hahahaha