quarta-feira, fevereiro 08, 2012

cedinho





De manhã cedo, meu coração se abre para a poesia, para o desejo no peito de escrever, latente. Poderia ser um horário preguiçoso demais para esse tipo de sentimento, mas talvez seja justamente por isso que ele exista: estou limpa. Estou, ainda e por pouco tempo, livre das manifestações mundanas. Os dedinhos do pé ainda com preguiça, tornozelo tá vagaroso, as mãos quase não seguram, apenas acarinham na esperança de que seja domingo, mesmo estando em plena quarta-feira. O coração ainda macio sem os desaforos e o calor do dia. munido de pouca fumaça, pouco barulho, poucos carros. sem grandes interferências, caminho quase que sem rumo, mesmo sabendo para onde vou. quem vou encontrar. O que vou resolver.  

Os cheiros começam lentamente a se fazer presente junto com todas as outras coisas que nos fazem lembrar o quão humanos somos. E as vontades, antes involuntárias, passam a ter nomes, marcas e horários:  O esmalte "xaréu" da impala, o tênis pra trocar da loja ao lado, telefonemas, onde irei almoçar, os pombos do largo do machado, as palavras lidas através da luz de um monitor. As notícias, a luz branca. As trocas infinitas de informação, os megas, bits e gigas que engolimos naturalmente na nossa luta diária. Os clicks, os tiques. o tic e tac do relógio que agora é digital e sempre me olha quando são 11:11h

E então o dia começa a se materializar, a ficar denso  e com formato de horas. Os olhos começam a enxergar o óbvio, e a poesia, entranhada, se esconde com vergonha. Por que parece pequena, invisível e incoerente perante aquele mundaréu de números, pessoas e canetas. Mas ela continua entranhada em mim pelo restante do dia e é esse meu maior sofrimento. Ela me busca e eu pego. Ela senta no meu colo e eu levanto. Ela caí e eu lamento. Ela volta e eu não tenho tempo. E Quando arrumo tempo, ela me escapa. E permanecemos na malemolência, no molejo, até o ínterim do encontro inevitável. Fazemos então as pazes, e aqui estamos, eu e ela - a palavra -  de mãos dadas para a poesia. 

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