segunda-feira, fevereiro 29, 2016

Você

Recorte no tempo ou uma colagem?

terça-feira, fevereiro 23, 2016

Pedacinhos

- Minha panturrilha é linda! É a parte do meu corpo que eu mais gosto. 
- A parte do teu corpo que eu mais gosto é o beijo, pensei.

- É bonita mesmo. Tua perna toda é bonita!

24h e uma vida - Final

O bar fechou. Tudo fechou. 5am. E agora? A gente tem que ir embora, né?

CA-RA-LHO, olhe isso. PQP, bateu. Será que só bateu agora? O que é isso, po?! Que água é essa? Que céu é esse? O que é isso? Bora ali ver de perto? Bora! Ei, bora subir nessas pedras e ver de perto mesmo? Sim! Silêncios. Sorrisos. Fotos. Não sei quanto tempo passou até que a gente decidisse que já tava bom de pedra, que a bunda tava doendo, que bora pra calçada. tirei meu tênis. Fiquei só de meias. Cuidado pra não escorregar! A onda quebrava nas pedras e espirrava na gente uma água gostosa. Vou escorregar não, fica peixe. Vou levantar! Queres ajuda? Segura aqui! E tu se levantava e, em seguida, caída de bunda nas pedras. Eita carai, tas bem? Uma crise de riso respondia que foda-se, to feliz. Sim, tas feliz mas tas preso. A bunda encaixou perfeitamente entre as pedras. E agora? Me dá cá a mão. E cadê força? Quem tem força dentro de uma crise de riso? Levanta, carai. Levantei. 

E agora, tá na hora de ir embora, né? Os ambulantes todos dormindo juntinho de seus isopores. Po, bora dar um relax aqui na calçada. Deitei. Deitasse. Deitamos. Riso e mais riso. Bora cochilar? Não, a gente vai acordar meio dia tostados, vai ser foda. Tá. Bora dar um tempo aqui, tá massa. Tá massa. Bom dia, gente! Falava uma alucinação ou um rapaz fazendo cooper em plena 7h de um domingo de carnaval em Olinda. Bom dia, a gente respondia sem entender. Ei, a gente tá há quase 24h em Olinda, po! Que do caralho! Nunca fiz isso. To compensando todos os anos de carnaval que perdi. Foda. Foda, mas bora nessa? Amanhã ainda tem mais farra. Po, pela hora, talvez valha a pena a gente ficar direto. Será? Po, não sei, a gente vai ficar muito fodido, né? É. A bronca é que a gente quer ver o show de noitão ainda, não vamos aguentar se emendar. E se a gente dormir ali junto dos ambulantes? Po, mas eles vão acordar jaja. E vai tá aquele sol mais foda do que já tá. E a gente tá cheio de lama desde 9h de ontem, po. A gente precisa dormir se quiser aproveitar hoje/amanhã. Então vamo nessa? Vamo! 

Que parede F-O-D-A. Foda. Porra, vou ter que gastar mais um foto dessa câmera. Já tirei 9, po. Ainda tem vários dias. Foda-se, a gente vai ter que fazer essa foto. Vai pra lá, pra tu sair nela! Beleza. Vou subir na janela, tá? Oxe, e tem como? Me dá um help ai que eu subo. Mas não tem onde segurar, porra. Quase não tem onde colocar os pés. Dane-se, dou meu jeito. Só saio nessa foto se for aqui em cima. Eita, tem dois pregos. Vou me sustentar nesses dois pregos. Clica logo! Tá! Ei, vira, po. Pra sair teu rosto. Clica logo carai, vou cair! Foi! Me ajuda a descer. Que cena linda. Tu em cima de uma janela só de meias e essa blusa escrita Carlaum. Espero que essa foto saia. Também!

Vamo nessa? Vamo!

Eita, tas ouvindo essa música? To. Porra, tem gente ouvindo música uma hora dessas? Vou bater na porta. Não, po, dispense. E então empurro a janela como quem não quer nada. E ela se abre. Uma casa, um bar? Que é isso? Querem tomar a saideira aqui? Pergunta um moço que surge na janela. R$5 a heineken. A gente avalia os bolsos: cada um tem 15 reais. E decidimos gastar o dinheiro do taxi em bebida. Po, separa o do busão, pelo menos. Duas cervejas, bate papo, uma luz linda. Vou ter que gastar outra foto desse filme, foda-se. Eu olho aquele canto, ele também. E se a gente dormir ali? Já tá na hora de voltar pra Olinda e a gente ainda nem saiu, po. Cara, a gente tem 5 conto no bolso cada um e estamos sem cartão, o que vamos fazer em Olinda ainda? Verdade. Vamo nessa. Vamo nessa.

Eu, de meias, agora imundas, caminho com os tênis nas mãos enquanto você sugere: se passar um bloco é um sinal - a gente fica. Combinado. Não passou bloco. E nem ônibus. A gente vai ter que caminhar até a pqp. O sol queimava demais as canelas. Só as canelas. Muito as canelas. Que louco! Tá queimando muito, porra! Tá foda. Eita, Cruz Cabugá, é o meu! Te estalei um beijo, não deu tempo para o abraço e pulei dentro do ônibus. Moça, você tá apenas de meias, alertava o motorista com o riso no canto de boca. Eu sei, moço. É que tá doendo demais meu pé. Você passa perto da Aurora, né? Sim, eu te deixo na Rua da Saudade.

Desco do ônibus, olho a placa: Rua da saudade. Rio e choro sozinha. Caminho em direção à Aurora tendo a certeza que sou a pessoa mais sortuda que conheço. Agradeço por tudo. Choro mais um pouco. Dou mais uma risada.

Rua da Saudade, dou um riso sacana. E o carnaval tá só começando!




24h e uma vida - Parte IV


*relatos sobre o sábado de carnaval dividido em fragmentos.



Ladeira da Misericórdia. Te puxo para o degrau: preciso falar com você agora! Gente, olha o arrastão! A gente precisa ir embora daqui agora! Podem ir, a gente vai conversar. Gente, tá vindo um arrastão. Foda-se, a gente vai conversar, podem ir indo, galera. Te puxo para o canto do degrau. Aqui ninguém vai roubar a gente, podemos conversar em paz. 

Encostados, ficamos ali, arrastão passando, o mundo se acabando e nós dois abraçados. Monólogo, lágrimas: uma tuia. Minhas e tuas. Seremos, então, só amigos. Não somos paquerinhas. Somos mais que essa porra toda. Não vamos agir assim, vamos ser como sempre fomos, parceiros e sem frescura, mesmo que em outro formato. Menos do que a gente era não tem condições. Somos muito mais que tudo isso. Sim, sim. Concorda? Concordo, mas não é fácil. Não é, ninguém disse que seria. Então estamos combinados, eu não te beijo mais. Chega. 

Um riso descontrolado: caramba, a gente teve uma DR no meio de um arrastão! Pqp, só podia ser a gente. Só podia. Vamo nessa? Vamo! Cacete, tá vazio aqui. Segura minha mão, bora descer essa ladeira correndo, assim ninguém nos rouba. Sim. Mãos dadas, firmes. 1, 2, 3 e já! Carreira. Riso. Carreira. Não tropeça pelo amor de deus. E agora? Bora pra Siba? Oxe, bora! Será que ainda tá rolando? Bora sacar. Siba, uma roda enorme, a galera animadíssima. Ele gostando sem conhecer, eu me esbaldando e entrando na roda de pogo, pra variar. Ele também. 

O show acaba e começa uma roda de côco com a xêpa carnavalesca. Eu no meio da roda dançando com minha saia imaginária. Que lindo isso! Tu dançando comigo. Que lindo isso! Eita, Beth! Bora entrar na roda? Bora! Que massa, tu aqui! A moça do ganzá foi embora, e agora? Agora eu pego o ganzá e seguimos o baile. E o côco não para. Alguém puxa uma música, depois outra, depois silencia e eu lanço Lia. Todo mundo na roda que agora virou de ciranda. Que lindo isso! Teus olhinhos assistiam a tudo brilhando sem parar. Fim da roda. E agora? Cerveja de garrafa naquele bar. Não pode mais entrar, gente. Ah, por favor, só uminha! Não pode. Puxa, nem comprar no balcão e sair com os copos cheios? Não, só vendemos sentado na mesa. Então deixa a gente entrar, é só uminha. Não. Po, libera ai só pra gente comprar uma, então. Ok. Uma cerveja, por favor! Litrão que dura mais? Sim! Eita, olha uma mesa ali. Ainda tem gente sentado. Senta ai. Sentamos. Eu, você, um litrão e dois sorrisos gigantes estampando aquela mesa. Tu me olha, eu te olho: caralho, eu te amo! Eu também, porra!!!

Barcelona, pis Joanic, eu, você. Sempre é assim. É inesgotável a conversa. E o sentimento. E as lágrimas. Teus olhinhos agora estourando de tão vermelhos. "É que é jogo sujo nossa história, po. É foda, nenhuma dá pra comparar. É difícil pra caralho pra mim, porra", você dizia entre lágrimas e um olhar distante, em 3 anos atrás. E eu do lado, entre um gole e outro, não tendo como não concordar. É foda mesmo. 
É foda, po! 

Um litrão, uma retrospectiva, o amor ali mais visível que osso em fratura exposta. 

Coração exposto. 

24h e uma vida - Parte III

*relatos sobre o sábado de carnaval dividido em fragmentos.



Demorei uns bons segundos pra entender que eu tava no chão. Pé no chão e mente flutuante. O carnaval é mesmo uma beleza! Cada ano mais. Como é bom estar aqui novamente. Aqui, exatamente aqui e desse jeitinho. 

Mangueira descendo a ladeira, um universo verde e rosa e minha vista endoidecida de cores e alegria. Isso podia durar pra sempre. Eu sempre me levando a sério. 

Partiu Acho é Pouco? Sim, não, sim, pera ainda, jájá, só mais um cadinho, não! Bora! Vocês vão? Sim, não, vou se ele for, vou se todo mundo for, bora, pera, não. Fui. Fomos. Cadê o dragão? Tá no Carmo, tá chegando no Carmo, faz tempo que não vejo, já acabou, claro que não, só acaba lá pra onze horas. Bora, apressa o passo! A gente vai pegar esse dragão. Ó ele ali! Eita, bora, bora. Cordão, banda, dragão, alegria. Alegria. Alegria. Aperto, aperta. Garganta, pulmão. Vermelho e amarelo. O vermelho e o amarelo morrendo no Carmo. Rodrigo tá chamando pra ir pra Gravatá ver o show de Jards, bora? Carai, a gente vai viajar a essa hora até Gravatá? Sim, po, Rodrigo passou o dia em casa, não bebeu e vai dirigindo. Vamo nessa? Vamo! Eita, o show já foi, era mais cedo. Bora em Juju, então? Bora! Desce 4 caldinhos de sururu e uma cerveja bem gelada. Sururu médio, cerveja quente. SMS. Ligação. Brecht brotando em juju, ajoelhado do meu lado. Uma alucinação. Um sonho. 

A galera tá ligando! Bora encontrar todo mundo? Bora! Todo mundo junto, todo mundo. Quando o dia parecia ter terminado, ele só tava começando. Bora no Fortim sacar o que tá rolando? Bora! Show médio, pessoas empolgadas. Cerveja, bora comprar uma cerveja ali. Um frevo animado tocou. Atravessei a avenida frevando como se o mundo fosse acabar. Quanto custa a cerveja? Pra você é de graça, estás trabalhando igual a mim, animando com tua dança o carnaval. Puxa, obrigada! Cerveja na mão e amigos orgulhosos. E agora? Casa de Amanda ali no Bonfim pra dar um tempo, bora? Bora! Violão e um bocado de gente cantando. A gente cantando. Fagner, Molejo, Djavan, o que viesse. Bora comprar cerveja? Bora! Um saco enorme de arroz daqueles bem brutos de feira cheio de cerveja e skol beats azul chegando na casa. Eita porra! Que instiga! E ai, galera, bora no Homem da Meia Noite? Sim, não, sim, não. SIM. Bora, tá na hora. Alguém sabe chegar lá? Eu sei! Porra, o gringo vai guiar a gente? Oxe, ele é o mais maloqueiro de todo mundo, minha gente, se enganem com essa carinha não.

Homem da Meia Noite. Um beijo. Uma frustração.Tiro, porrada e bomba. Cadê ele? Que demora danada! Ele vem mesmo? Vem! Ele passa por aqui mesmo? Sim, ele passa por aqui, nos informou uma menina dando toda uma aula sobre o Homem. Lá vem ele. Eita peste. Lá vem ele. Emoção, correria, quero ver de perto. "Só deu tempo de ver o nome Carlaum correndo atrás do homem, tu és muita instiga, Carlinha!" 

O Homem demora que só a passar e quando passa é tão rápido! Já acabou mas já tá tarde pra cacete. Vamo embora? Vamo! 

quinta-feira, fevereiro 18, 2016

24h e uma vida - Parte II

*relatos sobre o sábado de carnaval dividido em fragmentos.


A tatuagem corre pra lá e pra cá. Começa de manhã cedo, palhas enrolando minha cabeça e a pouca noção de tudo que tava por vir. Bom dia! Bom dia! Um riso frouxo sonolento me avaliava e sorria de alegria ao perceber que era sábado de carnaval. Até já! Até! Tas linda!

Um ônibus para o melhor dia do ano. Um ônibus para as ladeiras. Chegamos, nem acredito! Ainda tímida e em frente ao Mosteiro de São Bento, os barris de lama eram pura benção! Queria mergulhar ali como quem mergulha no carnaval. Aperto, aperta, aperto! Prefeitura. Aperto, mais aperto! Bora respirar! Bora comprar um axé! 


Um axé na mão e mil ladeiras na cabeça. Mac. Bowie. Que boniteza, que enormidade! Você ali. Você e a câmera de plástico, eu com o celular. Tchau, até já. A gente se encontra. Os bloquinhos são os mesmos. Sim, a gente se encontra, relaxe. Sim. Tchau, tchau! 

Sobe o MAC, desce o MAC. Encontro Paca que pergunta por Dumbo. Uma crise de riso me invade informando que bateu. 

"Tu tens noção que tem MUITA coisa pra acontecer hoje?" me perguntava Nath cheia de sabedoria. "Sim. A gente tá aqui agora, 11h. Mais tarde a gente corta a cena e pensa em tudo o que aconteceu", eu respondia entre um gole e outro do Axé.


Mangueira. Quanta gente querida. Que alegria desesperada! Purpurina, uma chuva delas. Um saco de um quilo rosa voando pelas mãos de Thales e pelas nossas mentes. Quanta gente querida! Que beleza que é esse bloco. Sim, mas tá parado. Tá morgado. Tá blasé. Ainda custa a sair. Que beleza de bloco! Sim, mas preciso andar, você também? Sim! 


Aperto, aperta. Caipi de Siriguela. Um riso, uma gargalhada, uma crise - mais uma. Um total descontrole, um derramamento. Uma barriga doendo de tanto sorrir. Bora voltar, o bloco já deve tá saindo! Bora ficar aqui em cima dessa calçada alta pra esperar o bloco descer. Bora! Eita, olha Lucas ali! Eita, ele tá vindo aqui! Braços abertos. Braços abertos de volta. Um abraço no ar. Um giro de 360 graus. Meus pés flutuando - literalmente - um beijo giratório. Sou devolvida para o mesmo local, mesma calçada e segue o carnaval.

"Que beijo bonito da porra!!!", é o que todos falam sem parar enquanto ainda me sinto flutuando. "Isso sim é um belo beijo de carnaval!", alguém completa.

24h e uma vida - Parte I

Meu sábado de carnaval não acabou. 

É verdade quando digo isso e vai além das 24h que passei em Olinda. Eu, que até então não tinha tatuagem no corpo, agora tenho uma que cirurgia nenhuma seria capaz de passar por cima mesmo que algum dia eu viesse à loucura e me arrependesse dela. 

Tem uma tatuagem bem bonita grudada em cada pedacinho de mim e quando paro pra avaliar com lupa, a tatuagem gruda mais um cadinho. Ela não tem forma definida, ela é líquida e gasosa e flutua sem parar em cada poro. Entra e sai de mim em cada respiração. Batuca e reverbera em cada batida no peito. Dá um passo a frente cada vez que me desloco. 

Meus pés, pequenos e grosseiros, carregam essa força toda. 
Meu coração, enorme e frágil, também. 

*relatos sobre o sábado de carnaval dividido em fragmentos.

quarta-feira, fevereiro 17, 2016

No ar (texto de 21 de Janeiro de 2016)

Você vai me encontrar no aeroporto. A primeira pessoa do Recife que vou encontrar e logo no aeroporto e logo você. Me surpreendo e em seguida penso que não haveria mesmo motivo pra ser diferente. Só então me dou conta da dimensão de tudo. Que irônico, sempre precisei passar por aeroportos pra te encontrar com uma felicidade de explodir o peito. E depois por eles novamente pra levar comigo e deixar contigo o gosto amargo do “adios”. 

Agora escrevo de dentro do avião e em menos de 1h vou ver esses olhinhos apertadinhos mais uma vez. Eu não acredito. Eu acho que é mentira. É mentira? Me pergunto muito seriamente. Percebi que não desgrudo o sorriso da boca nem por um segundo. Fechei os olhos e deixei o sol de fim de tarde corar meu rosto pela janelinha do avião. E meu sorriso largo continuava lá. Dei um cochilo e, entre a voz sensual da aeromoça no microfone e a cadeira que não acomoda muito bem o corpo, me vi sorrindo novamente. Pagar R$15 reais por um sanduíche sem graça também não me chateou. Ver que estou de blusão e short e sem nenhuma maquiagem e nem pompa pra te rever também não me desanima, sei que estou tão radiante que essa luz ultrapassa qualquer batom. Nada, nada tira meu sorriso da cara. Nem o aviso de que o voo atrasou 1h. Ainda assim o sorriso permaneceu.


Acho que quando a gente se encontrar, se olhar e caminhar em direção ao outro cada passo chegando mais perto, vai ser tanto do sorriso mas tanto do sorriso que o universo inteiro, de alguma forma, vai sorrir junto também.

No ar II

Hoje a lucidez tá me maltratando. Quem dera a embriaguez das madrugadas e do álcool e das pessoas e dele e de todo mundo junto pra esquecer isso que não se esquece: o peito. Saí de Recife mas ainda não cheguei no Rio. Fui enfiada dentro de um avião enorme com destino ao Galeão, mas não cheguei. Eu tava num posto de conveniência com tudo o que eu precisava do meu lado: eu e você. E ao mesmo tempo vazia, porque não havia você e nem eu, ao menos não como eu queria. Mas só em te ter ali, em vista, em cheiro, em gente, já era como se fosse tudo pra mim. Era maior que aquela cerveja Fax litrão. Era maior que os quilômetros que iriam nos separar novamente por tanto tempo mais uma vez e de novo. Não queria largar teu braço dentro daquele taxi. E nem teu abraço fora dele. E nem teus olhinhos miudinhos que me olham lá de cima imensamente. E nem aquela última chance de qualquer coisa que não pode ser. Que nunca vai poder ser. Nunca vai poder ser eu. Nunca vai poder ser você. Essa consciência é uma das coisas mais dolorosas que vive em mim e fica claro a cada encontro. Ao mesmo tempo que fica cada vez mais claro que não tem como não ser você. Que não tem como não ser eu. Ainda que todo mundo fale que quem sabe um dia no futuro, que muita coisa pode acontecer, que isso e aquilo. E quem quer saber desse dia diante do agora gritando e pulsando aqui dentro? 

Agora eu to aqui e você tá ai. Daqui a pouco eu estarei aqui e você lá. Curioso como me dói mais saber que tas tão pertinho do que no frio impossível às minhas mãos. Preferia, dentro de minha agonia e egoísmo, que você já estivesse lá bem longe. Que eu não pudesse te enviar ou receber um SMS sabendo que é uma comunicação territorial possível. Tas aqui do lado e ao mesmo tempo tão distante. Estarás em breve tão distante e ao mesmo tempo, como sempre, tão perto aqui dentro de mim. Que loucura! Como pode ser infinito e crescente algo que não se vê e quase não se tem a chance de nutrir? Quando foi que eu disse que dessa vez seria suave? Já tá liberado rir de mim pra ver se alivia? 

Serei monotemática por algum tempo. Coração e carnaval. E confusa. Não esperem coerência de um texto, se não há coerência no coração de quem vos fala.

quarta-feira, janeiro 20, 2016

O amor é um criador de apelidos

- Depois de amanhã a gente vai se abraçar!!!
- Eba!!! Meus ossinhos morenos! Meu sirizinho na lata! Minha Tereza da praia!

<3

terça-feira, janeiro 19, 2016

Quinta - ou o dia depois de amanhã

Arrisco dizer que depois de amanhã é o dia que mais esperei que chegasse durante quase três anos. 

Não, a razão para isso não é minha chegada em Recife. Sem querer desmerecer o reencontro com a "menina dos olhos do mar", não é por isso. É que duas vezes por ano em média estou por lá matando a saudade dos meus, dos gostos, cheiros, cores, de tudo. 

Dessa vez é diferente, a razão é outra. Faz quase 3 anos que não vejo uma pessoa muito querida e, finalmente, nos abraçaremos em nossa terra natal. Quem diria. Dois recifenses em Barcelona, 20 dias. Três anos depois: dois recifenses em Recife. Imaginamos e falamos tanto sobre esse momento e agora, tão perto, não consigo imaginar e nem sentir nada, nem mesmo euforia ou embrulho no peito. Faz tanto tempo que o tempo fica perdido no ar. A voz fica esquecida. O rosto fica turvo. Sem querer desmerecer esse encontro esperado durante 3 anos, agora sinto-me mais ansiosa pra comer caranguejo e sururu, por exemplo.

Os amigos tentam arrancar de mim um choro, um riso, uma emoção maior, igualzinho como sempre foi quando o assunto era você. E falam que vou chorar quando te encontrar pra ver se eu choro enquanto me falam isso. Ora, óbvio que devo chorar quando te encontrar! (Ou não, vai saber). Apenas não me sinto em rebuliço como previsto por todos. Claro, fácil falar isso agora, ainda distante de tudo. E ao mesmo tempo tão perto de estar próxima. Vai ver entrei em um estado de inércia forçado em relação a isso pra não entrar em erupção. Será?

Hoje trocamos telefone. Você com código 81 e eu, 21. Foi uma sensação engraçada salvar seu número, dessa vez tão curto, e escrever seu nome no meu celular: real demais. Nunca tivemos isso. A gente já deixava amarradinho local e horário de encontro. E se eu atrasasse pra chegar no Macba ou no Pis Joanic, distraída pela cidade como sempre, você já achava que eu tinha encontrado um catalão pelo caminho. E me recebia choramingando: "demorasse muito, po! tava com saudade já, faz mais isso não!" E dava uma risada com rosto todo vermelho. E eu invariavelmente voltava a fazer, fascinada pelos becos de Barça, me perdendo e me achando em cada nova esquina. E você voltava a me desculpar, porque  sabias que era bom demais me ter livre ali, voltando pra você por uma única razão: vontade. E então você vinha com esses braços enormes em minha direção prontos pra me fisgar. E era tão contagiante que a vontade que dava era de saltar pela janela e sair voando! 

Depois nos transformamos em postais. Em e-mails. Em fotografias no flickr. Facebook. Readaptamos nossa energia explosiva para letras. Foi bem duro. No início, skype vez por outra: na hora era mágico, depois era trágico meu estado de calamidade emocional. Cortei. Sem voz e rosto, nos sustentamos através de letras durante esse tempo todo.

Hoje escrevo esse texto pra deixar registrado o que sinto agora e tenho a intenção de me achar sensata demais daqui um tempo quando reler. Ou achar uma grande graça de mim, em ver que tudo virou de cabeça pra baixo novamente em um piscar de olhos - ou de dias -  e meu blog voltar a ser, praticamente, uma grande carta aberta e sem fim para você. 

Pode ser. Só que agora, teimosa que só uma ariana, digo duvido. Meus amigos diriam: vamos ver?

Epílogo

Eu podia seguir com você nesse jeito meio destrambelhado e funcional que criamos de compartilhar afeto. Um mais sincero que o outro. Parceiros no crime. O cuidado com o passo, uma explicação sobre algo que aconteça e que ultrapasse nosso controle, uma mensagem sempre com resposta. O encontro marcado. O namorico no banco de trás do taxi. A noite quente de corpos quentes e de mil lençóis no chão. A noite fria de mil lençóis no corpo e camisa e nó(s) nenhum que desse jeito pra aquecer. A chuva na janela. A música na cama e você por trás do violão: Assim falou Santo Tomaz de Aquino. A moldura sem pintura no teto da sala. A aquarela de presente de natal do eu-frevo por enquanto bem guardada (e com data!) criando coragem pra ser parede. "A magia do dia a dia, que é a mais bonita". As ladeiras de Santa, os sapatos dentro da caixa, o móbile celestial pendurado no teu porta-chave. Os mesmos livrinhos que você me mostra todas as vezes perguntando se já me mostrou antes. As músicas e suas histórias. As histórias. 

Pensei que talvez eu devesse ficar pelo cuscuz com ovo e queijo de coalho que você adorou ou por Cosmos que paramos no primeiro episódio. Ou pela sua tapioca que é uma mistureba maluca e que no fim dá certo e é bom pra burro. 

Acontece que o mundo é tão imensamente grande que lembrei que coração é feito pra voar. Pra inflar. E não pra ficar numa esfera tão limitada da saudade por algo que não foi e ninguém sabe se será. Uma hora essa conta iria bater na minha porta e o pagamento seria altíssimo. Contas que se pagam com o coração. 

Mirei, então, os três maguinhos que a gente mesmo criou. 

"Cansei de vocês". 

Pulei a janela e fui.

domingo, janeiro 17, 2016

Conta gota

Ontem me dei conta de que o filtro conta gotas de sua casa tentando encher a garrafa é a analogia perfeita do afeto, amor ou qualquer coisa que o valha tentando encher seu coração. 

sexta-feira, janeiro 15, 2016

Que seja doce?

Lembro-me de quando era adolescente e carregava uma frase de Caio Fernando Abreu quase que como um mantra. Eu e metade de minha turma: "que seja doce." A gente achava aquilo uma delícia, poético, profético, profundo. Hoje, depois de mais de dez anos, reli essa frase, que fica dentro de um texto que eu também adorava, que reside dentro do livro de crônicas que eu deixava reservado em cima de minha mesa de cabeceira, o Morangos Mofados, e hoje ela não me disse nada. Ou tão pouco. 

Que seja doce? Me perguntei achando tão bobo e superficial. Quase leviano, como se só de doce fizesse a vida. Como se só o doce salvasse, só o doce fosse bonito a ponto da gente desejar ele como um mantra. Hoje é tudo tão diferente, minha língua se atrai pelos salgados, azedos e até amargos. Pelo doce também, apenas não o semeio mais que os demais sabores. É o conjunto de sentires que faz a gente ser o que é, a querer o que queremos, a saber receber o que nos é dado. Não vou desejar o doce se sei que receberei também salgado. 

Que seja real, isso sim!

E fechei o livro deixando guardado ali pedaço de minha vida - que se foi.

quinta-feira, janeiro 14, 2016

Yin Yang

Enquanto um é todo rua
Do sofá o outro vê a chuva
Sinto-me completa
Completamente vazia
Completa(mente) lua

terça-feira, janeiro 05, 2016

Foi dada a largada

Senti que o mar do primeiro mergulho do ano foi um teaser do que será 2016: violento, movimentado, intenso e dando uns bons caixotes por trás enquanto eu driblo tudo pegando um jacaré rumo ao mate e a estampa colorida da canga que reluz embaixo do sol. Merecido sol.

segunda-feira, janeiro 04, 2016

Valencianas

O encontro do erudito com o popular é um troço que vai lá no âmago do meu peito e causa uma inquietude e vontade de desvendar o que, pra mim, não se desvenda, por mais detalhadas que sejam as explicações sobre regras, técnicas, métricas, velocidade, ritmo ou rimas: é feito pra sentir. É música, é alma. 

Valencianas, disco de Alceu em parceria com a Orquestra Ouro Preto, é o exemplo disso. Um belo recorte de seu trabalho adaptado pra um concerto. Sim, Alceu Valença e música clássica, quem diria? Tudo junto e misturado sem deixar de lado a responsabilidade em não perder a essência popular pernambucana, principal característica de sua trajetória musical. Parece muita informação, eu sei, mas não é. É certeiro e sorrateiro.

É suave ao mesmo tempo que é cortante. E tem gosto doce ao passo que é travoso feito a carne de caju que ele tanto canta. Sim, sou suspeita, essa mistura me ganha desde que ouvi Quinteto Armorial pela primeira vez e fiquei atônita por horas tentando entender a imensidão daquilo tudo. 

Quantos mundos cabem naquelas canções? E nessas? Onde estou e pra onde elas me levam a partir de agora? 

Não sei. Só sei que enquanto houver música em mim, a vida segue cheia de esperança!






Lembrete de Recife direto para o coração:

Estar ao lado todos os dias não significa estar próximo.
Próximo é estar dentro.


domingo, janeiro 03, 2016

O primeiro mergulho de chuva

Antes do ano acabar eu já programava o primeiro mergulho de 2016. 

Depois de tantos últimos mergulhos do ano, ficou a promessa daquele que seria o de entrada, o mergulho de cabeça e nado peito, que é como quero embarcar no ano do Macaco de Fogo, um ano que promete fortes emoções. 

Meus planos foram por água abaixo, literalmente. O ano começou mais vagaroso, sem sol e com muitas nuvens. Se por um lado isso me frustrava, também me causava um enorme alívio a não vontade de sair de casa e repor um pouco dessa energia não-solar. E ontem, que seria o dia do mergulho, o Rio nos presenteou com um tempo mais fresco e nublado no lugar de um mar verdinho. 

Eu, que ciceroneava colegas de Recife, me vi fugindo deles lá pelas tantas: mal entrei na festa e já fui-me embora, agoniada que tava com tanta gente, voz, fila, vida. Fui descendo aquelas ladeirinhas rumo casa até que o Bar do Gomes se joga na minha frente me chamando pra uma cervejinha solitária, sentada de boas naquela calçada pra depois descer tranquila. Solitária, quanta pretensão a minha! Foi chegar no balcão e dar de cara com Mauricio, sem chance de desviar o que quer que fosse. Um abraço desnorteado, feliz ano novo! Que coisa esquisita. No meio de tanto turista e nenhum conhecido: logo ele. De algum modo intrigante que não cabe em algoritmo algum: ele. 

Estamos brigados, ou melhor, não o vejo mais como o via, o que torna tudo mais grave que uma briga e, ainda assim, como um milagre de inicio de ano, dividimos a cerveja sem grandes prejuízos, intrigas e sem trocar uma palavra sobre todos os mal entendidos e desgostos dos últimos tempos. Duas pessoas maduras, uma ao lado da outra compartilhando da mesma garrafa e até do mesmo sorriso desconfiado, ainda que uma não faça mais parte da vida do outra. 

Finalmente choveu a chuva prometida. Chuva, muita chuva. Foi a deixa perfeita! Estava na hora de cumprir minha promessa: não tinha banho de mar, é bem verdade, mas tratei de dar um jeito nisso e logo fui pra casa descendo aquelas ladeiras embaixo de uma chuva torrencial, que ensopava o vestido, os cabelos, o corpo inteiro, por dentro e por fora. Chuva daquelas que mistura lágrimas com gotas de céu e ninguém seria capaz de identificar ou julgar. Dei uma volta completa no mundo que é a minha cabeça, em 78 por segundo rotações.

Alma lavada, acho que era mesmo isso. 

As coisas são como devem ser. Não teve banho de mar - ainda - mas teve o banho mais importante do ano: o do perdão ao próximo e, principalmente, a si mesmo.











sábado, janeiro 02, 2016

O sol, o breu e a barba ruiva

No fim do ano conheci um rapaz. Um moço que aos poucos foi mexendo comigo e que, de algum modo, sei que também causei algum rebuliço ali por dentro, talvez, quem sabe, no contar de algumas horas, entre a última música no violão e o despertar de manhã, em uma manhã dessas qualquer sem importância pra ninguém. 

Certa vez, quando vimos necessidade de deixar as coisas um pouco mais claras, ele se abriu comigo, mostrando um lado mais frágil e escuro. Sim, pra deixar as coisas mais claras ele me mostrou a escuridão. Bingo!

Lembro que no momento me senti privilegiada em tomar conhecimento de mais uma face daquele garoto tão obviamente do bem. Ter ciência daquilo não o tornava vulnerável a mim e ao mundo, pelo contrário, engrandecia ainda mais sua existência perante o Universo. Com aquela postura ele não me bloqueava ou afastava, como temia. Ele me protegia, me dava noção geral de tudo e opção de escolha: ele fazia a roda girar sem necessidade de adicionar óleo quando tudo já tivesse travado. O óleo era o próprio verbo.

"Sem o dia, não existe a noite. Sem a noite, o dia não chega." Era o que papai dizia quando a gente queria que o dia durasse pra sempre nos finais de semana porque a gente tinha medo do escuro. "Um não existe sem o outro e essa é a grande beleza da vida." Papai completava com um ar mais filosófico enquanto pra gente, na condição de moleques, era suficiente entender que ainda bem que existia a noite, porque só assim o dia chegaria de novo. Isso a gente entendia. E passamos a ser amigos da noite também. Se ela existe, por que vamos nos ausentar de suas possibilidades? E brincávamos de esconde-esconde, de casinha do terror, monstro da bananeira, contávamos quantos vagalumes passavam por nós, descobríamos a delícia de um banho de piscina noturno e como era muito divertido a contação de história de medo embaixo dos lençóis, onde ninguém podia ver ninguém, apenas ouvir e imaginar. E quando chovia? Quando chovia era melhor ainda. Ficávamos todos ali na varanda olhando os raios no céu, ouvindo os cachorros uivando, os sapos tagarelando, os pingos grossos fazendo um barulho no telhado que nem que eu viva mil anos eu posso esquecer, as infinitas partidas de ping pong e todos nós cantando juntos acompanhados do violão de papai tão afinado. Com o tempo viramos amigos da noite. O jogo virou. Foi preciso até um freio pra que a gente continuasse aproveitando o dia sem perdas e danos. O danado do equilíbrio. Os opostos complementares.

Ter consciência sobre si é um caminho que nem todo mundo busca por medo de se ferir, por medo do desconhecido, de esbarrar com algo que pense não dar conta e acaba escolhendo o trajeto mais fácil. Uma morada embaixo do sol, a ilusão de ter as ideias sempre bem claras. Acontece que sol demais queima. Sol demais dói a retina e no fim vira breu. Um breu forçado. Uma dor adiada e maquiada que vem mais forte. Tudo que vem de supetão causa um solavanco mais intenso e sem direito a negociações. Ora, antes a gente tivesse apertado a mão do breu desde o início e encarado ele não como um inimigo, mas como um aliado. Somos feitos dessas nuanças, ninguém escapa pra sempre dessa condição: somos o que somos. Somos luz e solidão. Yin Yang. Sagrado e mundano. 

Hoje tudo faz sentido. Papai que sabia das coisas. E isso sempre viveu e existiu dentro de mim, principalmente quando sofro e enlouqueço de noite pra clarear e ser lúcida de dia. Eu vivo sabendo que é assim, que eu não preciso morrer, que crescer e se enxergar nua dói mas é importante demais. Curioso é que eu nunca tinha feito a ligação dos ensinamentos literais sobre escuro e claro de minha infância com o escuro e claro emocional. Foi preciso que um rapaz de barba ruiva me atentasse a isso, fosse luz na minha fresta. 

Que transformasse o verbo em óleo pra fazer a roda girar harmonicamente.